Nascida em 1925 na cidade de Conquista, interior de Minas Gerais, Janete começou a fazer o Brasil sonhar com suas histórias no final da década de 40. Antes disso foi radioatriz, locutora e datilógrafa. Já casada com o também autor Dias Gomes, passou a escrever para ajudar no orçamento familiar e, em 1967, já tinha no currículo mais de 30 radionovelas. Neste período passou a assinar “Janete Clair”, por sugestão do radialista Octavio Gabus Mendes. O sobrenome era uma alusão a uma de suas músicas favoritas: “Clair de lune”, do compositor francês Claude Debussy.
Janete Clair faleceu aos 58 anos de idade,
sem concluir a novela Eu Prometo
(Foto: CEDOC/ TV Globo)
Gloria Perez conhecia pouco de telenovela e Janete era uma sumidade no assunto. A estreante não imaginava o tamanho da responsabilidade que estava por vir: com a morte da autora, Gloria deveria assumir o posto na obra de uma das maiores dramaturgas do país. Pouco tempo de convivência foi suficiente para a novata aprender a lição: a novela tem essa coisa de satisfazer o seu sonho, até o sonho que a vida não te dá como, por exemplo, o grande amor, o amor impossível, o príncipe encantado e todas essas fantasias que estão embutidas na cabeça das pessoas. E a Janete transpunha isso para a tela de uma maneira tão verdadeira, tão sincera, que todo mundo comprava – afirmou ela para o jornalista Edney Silvestre no Globo Repórter de 2005.
Do rádio para a televisão: a radioatriz virou dramaturga
Antes de começar a escrever, Janete foi
radioatriz e datilógrafa
(Foto: CEDOC/ TV Globo)
Uma pessoa que se fazia amar muito depressa, uma mulher verdadeira e apaixonada pelo trabalho. É assim que Glória Perez Gloria descreveu Janete Clair em um depoimento ao Globo Repórter pouco tempo depois da morte da autora, em 1983. Aos 58 anos de idade, a mineira registrada como Jenete Stocco Emmer deixou orfãos muitos espectadores e também os personagens da novela Eu Prometo, que ela não conseguiu concluir. O câncer no intestino a deixou muito debilitada e a autora precisava urgentemente de uma colaboradora.
Sua chegada à Rede Globo foi repentina: a autora foi chamada às pressas para ajudar a salvar a novela Anastácia, a Mulher sem Destino. Estrelada por Leila Diniz, a trama sofria com a baixa audiência, alto custo de produção e elenco numeroso. Para solucionar o problema, Janete inventou um terremoto que devastou a ilha onde se passava a trama, eliminando mais de 100 integrantes. A partir daí surgia uma nova história e Janete Clair conseguiu fazer a trama engrenar. O trabalho garantiu a permanência da autora na emissora.
Tarcísio Meira e Glória Menezes em Sangue e Areia (1967)
e Cláudio Marzo e Regina Duarte em Véu de Noiva (1969)
Fotos: CEDOC/ TV Globo
Em seguida, Janete Clair escreveu Sangue e Areia (1968), Passo dos Ventos (1968) e Rosa Rebelde (1969). O estilo naturalista e próximo da realidade brasileira, criado por ela, virou referência. Véu de Noiva, sua novela seguinte, tinha diálogos curtos e coloquiais, personagens e cenários contemporâneos, o que era uma grande inovação.
A autora com o marido, o também autor Dias Gomes
(Foto: CEDOC/ TV Globo)
"Eu acho que eu entendo um pouco da psicologia do povo, eu sei o que o povo gosta de ver, o que ele gostaria de sentir naquele momento. É uma comunicação de gente para gente, de emoção para emoção. Eu não estudei para isso, mas é uma intuição, um sexto sentido" – afirmou Janete Clair em entrevista ao Jornal Hoje em 1982.
A história de amor que garantiu cem pontos de audiência
Tarcísio Meia como o herói João Coragem na novela
Irmãos Coragem e Franscico Cuoco com Regina Duarte,
o casal que conquistou o público em Selva de Pedra.
(Foto: CEDOC/ TV Globo)
A consagração veio em Irmãos Coragem (1970), trama responsável pelo início da liderança da Rede Globo no horário nobre. Um ano depois foi a vez de escrever O Homem que Deve Morrer, seguida de outro grande sucesso, Selva de Pedra (1972). A conturbada história de amor entre os personagens de Francisco Cuoco e Regina Duarte levaram Janete ao patamar de única autora, até hoje, a conquistar cem pontos de audiência.
Janete Clair ao lado do ator Tony Ramos, um dos
grandes destaques da trama de O Astro
(Foto: CEDOC/ TV Globo)
Em 1973, a autora escreveu O Semideus, para substituir uma trama que havia sido censurada poucos dias antes da gravação. A novela proibida era Fogo sobre Terra, que foi liberada e estreou no ano seguinte. Em 1975, estreou no horário das sete ao lado de Gilberto Braga com a novela Bravo!, mas foi chamada para escrever uma trama para substituir Roque Santeiro, vetada pela censura. Surge assim Pecado Capital, outro grande sucesso.
Em 1976 lançou Duas Vidas e em 1977 escreveu O Astro, onde mobilizou o Brasil ao lançar a pergunta “Quem matou Salomão Hayalla?”. Ela também escreveu Pai Herói (1979), Coração Alado (1980), Sétimo Sentido (1982), além de Eu Prometo (1983), seu último trabalho. Foram cerca de trinta anos inventando personagens, retratando a realidade brasileira e emocionando milhares de telespectadores. Para o autor Gilberto Braga, Janete Clair continua viva na memória do público e de quem continua a criar histórias na televisão do país.
"É impossível pensar em novela sem lembrar de Janete. Ela nasceu com uma total possibilidade de identificação com o povo brasileiro. Era capaz de, em uma mesma história, atingir todas as classes. Ela conhecia o povo e a arte do folhetim por intuição. Dificilmente alguém vai conseguir fazer isto da mesma maneira que ela sempre fez", afirmou o autor em uma entrevista de 1983.
Alccy Marthins